"Eu estou à porta e chamo... diz o Senhor."
… E num belo dia de Julho do ano de 1940 chamou Beatriz Fiusa Costa, de 38 anos de idade ‑ que, sob a direcção do Rev.do Pe. Eliseu Maria Maia, deixou Portugal e foi viver, "em obséquio de Jesus Cristo", na vizinha Espanha, no Carmelo de Santa Ana (Sevilha).
Três meses depois... o Senhor bateu à porta do coração da jovem ‑ Julieta Maria do Carmo Mósca, de 19 anos de idade ‑ que o mesmo sacerdote, Rev.do Pe. Eliseu Maria Maia, acompanhou também ao Convento de Santa Ana, em Sevilha.
Beatriz tinha decidido abandonar o Convento. Porém, a chegada de Julieta, falando a mesma língua e possuída de grande entusiasmo pela vida do Carmelo, fê‑la mudar de opinião e permanecer no Convento. Começaram, então, a rivalizar uma com a outra em delicadeza e caridade, rivalidade que mantiveram durante toda a vida terrena.
Beatriz tomou hábito em 02‑02‑1941, recebendo o nome de: Irmã Maria de Fátima e da Santa Face. Julieta tomou hábito em 24‑03‑1941, recebendo o nome de: Irmã Maria do Pilar e da Santíssima Trindade. A Irmã Maria de Fátima fez a sua Profissão Simples em 03‑02-1942. A Irmã Maria do Pilar fez a sua Profissão Simples em 25‑03‑1942.
No ano de 1943, Jesus pediu à Irmã Maria do Pilar a fundação de um Carmelo da Antiga Observância em Portugal.
O ano de 1945 foi o ano das Profissões Solenes. A Irmã Maria de Fátima em 03‑02 e a Irmã Maria do Pilar em 25‑03.
A ideia da fundação de um Convento em Portugal foi criando raízes em seus corações. Os donos da Quinta do Bosque, Amadora, informados do sonho das duas Irmãs, ofereceram ajuda. Aproveitando a oferta, as duas freiras portuguesas ‑ Irmã Maria de Fátima e da Santa Face Fiusa Costa e a Irmã Maria do Pilar e da Santíssima Trindade ‑ decidiram‑se a deixar o Carmelo de Santa Ana de Sevilha.
Houve grande dificuldade em obter licença para a fundação. Foi concedida pelo Senhor D. Agostinho de Sousa, então Bispo do Porto, em 24‑06‑1946. E a de sair de clausura, em 14‑02‑1947, pelo Cardeal Segura de Sevilha.
Regressaram as Irmãs à sua Pátria a 27‑03‑1947. Os benfeitores receberam‑nas em casa. Apresentaram‑se ao seu novo Prelado. Foram ver algumas propriedades indicadas. Nada se encontrou que satisfizesse.
Eram outros os desígnios do Senhor. Vencidas várias dificuldades, a Divina Providência manifestou a Sua Vontade, indicando rumo para Bragança pela serva de Deus D. Sílvia Cardoso que, sabendo do desejo do Senhor Bispo D. Abílio Augusto Vaz das Neves de ter um Carmelo na diocese, se interessou escrevendo directamente ao Ex.mo Prelado que, benevolamente, acolheu as duas Irmãs disposto a patrocinar a obra.
No Franco, Mirandela, estava à venda uma propriedade em boas condições. Mas depois a proprietária desistiu da venda e os benfeitores desistiram da sua oferta.
Assim, sem recursos, às duas Irmãs só restava regressar ao Carmelo sevilhano. A 15‑08‑1947 foram a Pereira falar com o Sr. Bispo D. Abílio, a quem apresentaram a situação e a decisão tomada. Sua Ex.ª Rev.ma disse que, desejando tanto um Carmelo na Diocese, o Senhor lhe mandara duas freiras. Não consentiria que partissem, que confiava na Sua omnipotência. Almas generosas ajudariam a fundação. E as duas religiosas ficaram, confiando na bênção de Deus dada pelo Sr. Bispo. Este passou um cartão a recomendar a obra. Com ele foram visitados vários pontos da Diocese.
Foram também a Moncorvo, por constar que uma senhora desejava ajudar uma obra pia. Mostrou as melhores disposições e ficou assente que, no fim do ano, iriam habitar na casa da benemérita D. Carlota José de Mendonça Cyrne, enquanto não se construísse, no terreno oferecido, alguma parte que fosse habitável. Chegaram a 23‑12‑1947. Ficaram num casebre da quinta para poder levar a sua vida eremítica. Em ano e meio viveram num estábulo de chão térreo, telha vã e uma manjedoura.
Eram felizes nessa vida de tanta pobreza. Tinham dias que só comiam couves cozidas e o chá que bebiam era a água de cozer as couves. Havia noites que não conseguiam dormir com o frio que fazia e com o barulho de muitos ratos. A Madre Maria do Pilar dormia com uma chibata na mão para espantar os ratos quando os sentia. Tudo sofriam com amor.
Entretanto, o competente Arquitecto Vasco de Moraes Palmeiro (Regaleira) fez o projecto do mosteiro pedindo como paga apenas um «Pai Nosso» por sua intenção, esposa e filhos. No Céu terá recebido a recompensa da sua caridade.
Uma amiga de infância da Irmã Maria de Fátima ‑ Sra. D. Mercedes ‑, ofereceu uma jóia que rendeu a bela quantia de 107.000.00. escudos, o que permitiu que as obras do Convento se iniciassem em 15 de Março de 1948!
As duas Madres percorreram as aldeias quase todas da Diocese a fazer peditório, mas esta Diocese era muito pobre. Chegavam à noite e só tinham pedaços de pão, feijão e algum Azeite. Um dia a Madre Maria do Pilar, depois de um dia de calor e cansaço, chegou ao Convento só com uma moeda de cinco centavos. Esta moeda foi posta num saquinho e colocada ao pescoço de S. José, como que a pedir dinheiro para continuar a obra. O bom S. José nunca faltou.
O Sr. Bispo de Bragança‑Miranda obteve licença do Sr. Cardeal Patriarca de Lisboa ‑ Senhor Dom Manuel Cerejeira ‑ e da Santa Sé para as Irmãs poderem fazer peditório em Lisboa.
As vocações foram surgindo... e a Providência Divina colocou no caminho da Irmã Maria do Pilar uma sua amiga de infância ‑ a Sra. D. Maria de Lourdes Teixeira, Terceira Carmelita ‑ que, muito feliz com este encontro, pôs a sua casa à disposição das Irmãs, sem qualquer encargo para o Carmelo, onde as Irmãs permaneceram vários anos. Essa pequena casa era um pequeno Carmelo onde às 6h e 30m se rezava o Oficio Divino em comum, saindo depois para a Santa Missa, depois da qual voltavam para almoçar. Antes da saída rezavam em comum:
ORAÇAO
“Ó Jesus, por Vosso amor, deixo a minha solidão, para voltar ao mundo. Que nem sequer o seu pó eu traga, pegado às sandálias, quando regressar.
Gravai‑Vos na minha memória tão profundamente que jamais seja capaz de Vos esquecer; na minha inteligência de tal modo que nunca cesse de Vos contemplar; e que o meu coração viva instantemente no Vosso Amor.
Banhai os meus sentidos na Vossa Pureza e Santidade, a fim de que eu possa ser um Vosso anjo a caminhar sobre a face da Terra, espalhando os Vossos aromas sem ser reconhecida.
Peço, ó Jesus, a Vossa bênção para todos os caminhos que eu percorrer, para todas as pessoas que neles encontrar, para todos os campos que vir, para todas as povoações onde entrar, para todas as casas a cujas portas bater, para todas as pessoas a quem pedir, para todas as almas aflitas, para todas as crianças abandonadas, para todos os pobrezinhos, doentes e agonizantes.
Ó Jesus, que por mim, Vós passeis de novo pela multidão, fazendo bem a todos”.
NORMAS NO PEDITÓRIO
1.º ‑ Nas delicadas particularidades da vida, tomar parte somente quando as criaturas a isso me sujeitarem. Nestas circunstâncias, seja a minha atitude de prece, invariavelmente.
2.º ‑ Permitir‑me a alegria pelo bem que as almas recebem ao dar a esmola; mas nunca a alegria que alimenta o espírito de ambição. Sempre que não haja motivo particular que me exija outro procedimento, quero não ver a moeda que recebo.
3.º ‑ Vigiar‑me para não cair em censuras mentais e, muito menos, em apreciações, comparações ou, mesmo, elogios relativamente às pessoas que dão e às pessoas que não dão.
E saíam por volta das 9h, realizando o peditório e regressando a casa quase ao pôr-do-sol.
À noite rezava‑se novamente o Oficio Divino em Comunidade e o Santo Rosário. Depois de um dia de cansaço, de subir e descer escadas, tinham de fazer todo o trabalho de casa: cozinhar, lavar, engomar, passajar a roupa que naquele tempo era tão pobre! Todos os dias tinham de passajar as meias. Tinham noites em que não se deitavam. Quando chovia passavam parte da noite a secar os hábitos ao ferro porque só tinham um hábito e um véu e muito velhinhos! Estas Irmãs passaram muitas necessidades, fome, sede, frio, cansaço, muitas noites sem dormir. Tudo só por amor de Jesus e Sua Mãe Santíssima, pela Igreja e conversão dos pecadores.
A Providência Divina tudo dispôs com Sabedoria, pois que o Rev.do Pe. Frei Bartolomeu Xiberta, sempre que passava por Lisboa, ficava alguns dias a dar formação e orientação às Irmãs! Dizia: "Onde está uma carmelita está o Carmelo e onde está o Carmelo está Maria".
Nas Festas ‑ Natal, Páscoa, Mãe Santíssima, 16 de Julho, e no Retiro anual regressava ao Convento em Moncorvo.
O Sr. Bispo D. Abílio em, 5‑6‑1948, nomeou superiora da nascente Comunidade a Irmã Maria de Fátima e da Santa Face. A erecção canónica foi concedida a 19‑12‑1948, em documento assinado pelo P. Geral Killian Linch e pelo secretário geral Frei Bartolomeu Maria Xiberta.
Por intermédio do grande transmontano Eng.º Trigo de Morais, foi concedida a comparticipação do Estado para a construção da Igreja e anexos, considerada de utilidade pública em 1949, mas só foi a obra a concurso em 3‑3‑1958.
A 15‑7‑1949, as fundadoras e uma postulante entraram na casa do Noviciado, ainda sem telhado nem janelas. Pouco depois uma senhora ofereceu uma quantia precisa para o telhado. Na casa do Noviciado viviam como se tivessem clausura; não saíam para o terreno enquanto os operários estavam a trabalhar. A construção, do Convento foi feita por partes. Só trabalhavam quando havia dinheiro, de contrário estavam as obras paradas. Desejavam muito preparar uma sala para Capela provisória. Finalmente, o Sr. Bispo D. Abílio celebrou lá a primeira Missa em 1‑6‑1950.
A senhora que deu o terreno era um pouco doente e causou grandes sofrimentos às duas Madres. Um dia ameaçou‑as com a Polícia e prisão. Mais tarde, bateram à porta do Convento do qual, por essa época, ainda só existia o Noviciado. Pensando que eram os polícias que as vinham buscar para a prisão, vestiram as capas brancas para se apresentarem ás autoridades. Quando abriram a porta, em vez de polícias, encontraram dois senhores que traziam a imagem de Nossa Senhora do Carmo que, anteriormente, tinham mandado fazer e que esperavam com ansiedade. O grande sofrimento das duas Madres transformou‑se em grande alegria. Nossa Senhora quis ser recebida de capas brancas e que a Sua chegada fosse preparada com grande sofrimento.
As duas Fundadoras tinham grande confiança em S. José. Pediram, então, aos trabalhadores para fazerem uma coluna de cimento e nela colocaram uma imagenzinha do grande Santo que era de cobre. Quando se começava uma parte do Convento, S. José ficava num dentilhão dia e noite, à chuva, ao Sol, a todo o temporal, a comandar as obras e, ao terminar uma parte da construção, a coluna com S. José era colocada na outra parte ainda por construir. E, assim, o bom S. José andava sempre de um lado para o outro, até se concluir todo o Convento. No fim, esta imagenzinha foi colocada numa gruta na rocha e mais tarde deu-se-lhe um lugar de honra com uma imagem mais adequada. Ainda hoje a imagenzinha é muito querida a esta Comunidade.
Satisfazendo um grande desejo, desde o início de 1955, a Santa Sé concedeu o privilégio da Adoração Perpétua a Jesus Sacramentado que devotos fiéis ajudam a manter com as suas esmolas.
A 28‑12‑74 foi a inauguração da Igreja presidindo, como delegado do Prelado, o Sr. Pe. Eugénio Sobrinho, pároco e arcipreste de Moncorvo. Estavam presentes muitos sacerdotes e muitas pessoas de Moncorvo, Larinho e as famílias das Irmãs.
A 16 de Julho do ano de 1977, festa de Nossa Senhora do Carmo, o Sr. D. António José Rafael, Bispo Auxiliar da Diocese, em nome do Sr. Bispo D. Manuel de Jesus Pereira, presidiu à Sagração do Altar, à bênção da Via‑Sacra e à bênção dos dois sinos da torre.
O ritual desconhecido e impressionante foi seguido com muito interesse: preparação da Água Lustral ou Gregoriana, Ladainha dos Santos, Lustração, Trasladação das Relíquias (de S. Ovídio, S. Alberto da Sicília ‑ carmelitas; S. João Bosco, S. Francisco de Sales, Santa Joana Francisca de Chantal, Santa Rafaela do Sagrado Coração); Unção Crismal, Turificação e Prece Consecratória; Inauguração com a Vestição do Altar e a celebração da Eucaristia.
Pedra a pedra, a obra foi surgindo e, em 1990, o sonho deu lugar à realidade!
O Convento estava concluído e a mostrar a toda a gente que o Senhor se serve dos fracos e dos pobres para realizar os seus projectos.
Decorridos dois anos, em 1992, o Senhor disse à Irmã Maria de Fátima "serva boa e fiel, vem gozar a alegria do teu Senhor"... e a Irmã adormeceu no Senhor rodeada de todas as suas filhas.
Em 1997, a Irmã Maria do Pilar foi, de coração agradecido, ao encontro do Pai das misericórdias. As duas Madres fundadoras já se encontrando na visão beatifica, na plenitude do amor de Deus e da Nossa Querida Mãe Santíssima do Carmelo, pedimos a sua bendita intercessão.
Mais sete Irmãs partiram já para o Pai.
Actualmente, o Convento acolhe dez Irmãs Professas Solenes, cinco Junioras e uma Noviça.
Pedimos ao Senhor da messe que nos envie multas e santas vocações.
Irmã Maria da Sagrada Família