II Domingo do Advento - Ano B

2º DOMINGO DO ADVENTO (ANO B)

7 de Dezembro de 2014

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Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Marcos (Mc 1, 1-8)

1Princípio do Evangelho de Jesus Cristo, Filho de Deus. 2Conforme está escrito no profeta Isaías: «Eis que envio à tua frente o meu mensageiro, a fim de preparar o teu caminho. 3Uma voz clama no deserto: 'Preparai o caminho do Senhor, endireitai as suas veredas'».

4João Baptista apareceu no deserto, a pregar um baptismo de arrependimento para a remissão dos pecados. 5Saíam ao seu encontro todos os da província da Judeia e todos os habitantes de Jerusalém e eram baptizados por ele no rio Jordão, confessando os seus pecados. 6João vestia-se de pêlos de camelo e trazia uma correia de couro à cintura; alimentava-se de gafanhotos e mel silvestre. 7E pregava assim: «Depois de mim vai chegar outro que é mais forte do que eu, diante do qual não sou digno de me inclinar para lhe desatar as correias das sandálias. 8Eu baptizei-vos em água, mas Ele há-de baptizar-vos no Espírito Santo».

Chave de leitura

A unidade literária de Marcos 1, 1-13, à qual pertence o nosso texto (Mc 1, 1-8), é uma breve introdução ao anúncio da Boa Nova. São três os pontos principais: 1) A Boa Nova é preparada pela actividade de João Baptista (Mc 1, 2-8). 2) É proclamada por ocasião do Baptismo de Jesus (Mc 1, 9-11). 3) É provada no momento da tentação de Jesus no deserto (Mc 1, 12-13). Nos anos 70, época em que Marcos escreve o seu Evangelho, as comunidades viviam numa situação difícil. Do exterior eram perseguidas pelo império romano. A partir de dentro viviam-se dúvidas e tensões. Alguns grupos afirmavam que João Baptista era igual a Jesus (At 18, 26; 19,3). Outros queriam saber como deviam começar o anúncio da Boa Nova de Jesus. Nestes poucos versículos Marcos começa a responder, narrando como se iniciou a Boa Nova de Deus que Jesus nos anuncia e qual é o lugar que João Baptista ocupa no projecto de Deus.

Contexto de então e de hoje

O Evangelho de Marcos começa deste modo: Princípio do Evangelho de Jesus Cristo, Filho de Deus (Mc 1, 1). Tudo tem um início. Também a Boa Nova que Jesus nos comunica tem um princípio. Cita os profetas Isaías e Malaquias e menciona João Baptista, que prepara a vinda de Jesus. Marcos mostra-nos, deste modo, que a Boa Nova de Deus, revelada por Jesus, não caiu do céu, mas que vem de longe, através da História. E tem um precursor, alguém que preparou a vinda de Jesus. Também para nós a Boa Nova chega-nos através de pessoas e acontecimentos bem concretos que nos indicam o caminhos que leva a Jesus. Por isso, ao meditar o texto de Marcos, convém não esquecer esta pergunta: “Na história da minha vida quem me indicou o caminho que conduz a Jesus? Ajudei alguém a descobrir a Boa Nova de Deus? Fui o precursor para alguém?”.

Comentário do texto

Marcos 1, 1:
Princípio do Evangelho de Jesus Cristo, Filho de Deus. Na primeira frase do seu Evangelho, Marcos diz: Princípio do Evangelho de Jesus Cristo, Filho de Deus! (Mc 1, 1). No final do Evangelho, no momento da morte de Jesus, um soldado romano exclama: Verdadeiramente este homem era o Filho de Deus! (Mc 15, 39). No princípio e no fim encontra-se este título de Filho de Deus. Entre o princípio e o fim, ao longo das páginas do Evangelho, Marcos esclarece como deve ser entendida e anunciada esta verdade central da nossa fé: Jesus é o Filho de Deus.

Marcos 1, 2-3: A semente da Boa Nova está escondida na esperança das pessoas. Para indicar o começo da Boa Nova, Marcos cita os profetas Malaquias e Isaías. Nos textos destes dois profetas aparece a esperança que habitava nos corações das pessoas no tempo de Jesus. As pessoas esperavam que o mensageiro, anunciado por Malaquias, viesse a preparar o caminho do Senhor (Mal 3, 1), segundo o que tinha sido proclamado pelo profeta Isaías que diz: Uma voz grita: «Preparai no deserto o caminho do Senhor» (Is 40, 3). Para Marcos a semente da Boa Nova é a esperança suscitada nas pessoas pelas grandes promessas que Deus tinha feito no passado por meio dos profetas. É importante descobrir a esperança que as pessoas têm no seu coração. A esperança é a última a morrer!

Marcos 1, 4-5: O movimento popular suscitado por João Baptista faz crescer a esperança das pessoas. Marcos faz como também nós fazemos. Serve-se da Bíblia para iluminar os acontecimentos da vida. João Baptista tinha provocado um grande movimento popular. Toda a região da Judeia e todos os habitantes de Jerusalém iam ao encontro de João! Marcos serve-se dos textos de Malaquias e de Isaías para iluminar este movimento popular, suscitado por João Baptista. Indica que com a vinda de João Baptista a esperança do povo começou a encontrar uma resposta, a realizar-se. A semente da Boa Nova começa a despontar, a crescer.

Marcos 1, 6-8: João Baptista é o Profeta Elias que as pessoas esperavam. Do Profeta Elias dizia-se que vinha preparar o caminho do Messias “convertendo o coração dos pais para com os filhos e o coração dos filhos para com os pais!” (Mal 3, 24; cf. Lc 1, 17), ou seja, esperavam que Elias viesse  reconstruir a vida comunitária. Elias era conhecido como “um homem vestido de peles e com um cinturão feito de couro à cintura” (2Re 1, 8). Marcos diz que João se vestia com peles de camelo. Indicava com claridade que João Baptista tinha vindo a cumprir a missão do Profeta Elias (Mc 9, 11-13).

Nos anos 70, época em que Marcos escreve, muitas pessoas pensavam que João Baptista fosse o Messias (cf. At 19, 1-3). Para ajudá-las a discernir, Marcos cita as palavras do próprio João: “Depois de mim vem aquele que é mais forte do que eu e de quem não sou digno de desatar as suas sandálias. Eu baptizei com água. Ele baptizará no Espírito Santo”. Marcos diz-nos que João indica o caminho para Jesus. Faz saber às Comunidades que João não era o Messias mas antes o seu precursor.

O contexto mais amplo do Evangelho de Marcos (Mc 1, 1-13)As pessoas pensavam que o baptismo de João era uma realidade vinda de Deus !(Mc 11, 32) Tal como o povo, também Jesus percebia que Deus se manifestava na mensagem de João. Por isso, saiu de Nazaré, chegou ao Jordão, e colocou-se na fila para receber o baptismo. No momento em que estava a ser baptizado, Jesus teve uma experiência profunda de Deus. Viu os céus a abrirem-se e o Espírito Santo descer sobre Ele, e a voz do Pai que dizia: “Tu és o meu Filho predilecto. Em ti pus toda a minha confiança. Nesta breves palavras aparecem três pontos muito importantes:

I - Jesus experimentou Deus como um Pai e vê-se a si mesmo como um Filho. Eis aqui a grande novidade que Ele nos comunica: Deus é Pai. O Deus que estava longe como Deus Altíssimo torna-se próximo como Pai, bem próximo como Abba, Papá. Isto é o centro da Boa Nova que Jesus nos traz.

II - Uma frase que Jesus ouviu do Pai e do profeta Isaías, em que se anuncia que o Messias é o Servo de Deus e do povo (Is 42,1). O Pai indicava a Jesus a missão do Messias Servo e não a de um Rei glorioso. Jesus assumia esta missão de serviço e foi fiel a ela até à morte, e morte de cruz! (cm Fil 2,7-8). Ele disse: “Não vim para ser servido mas para servir!”(Mc 10,45).

III - Jesus viu o céu a abrir-se e o Espírito descer sobre ele. Precisamente quando Jesus descobre a sua missão de Messias Salvador, recebe o dom do Espírito Santo para poder desenvolver a missão. O dom do Espírito Santo tinha sido prometido pelos profetas (Is 11, 1-9; 61, 1-3; Jl 3, 1). A promessa começa a realizar-se solenemente quando o Pai proclama Jesus como seu Filho predilecto.

Depois do Baptismo o Espírito de Deus toma posse de Jesus e lança-o para o deserto, onde se prepara para a missão (Mc 1, 12s). Marcos diz que Jesus permaneceu no deserto 40 dias, e que foi tentado pelo demónio, Satanás. Mateus 4, 1-11 explica as tentações, tentações que assaltaram o povo no deserto depois da saída do Egipto: a tentação do pão, a tentação do prestígio, a tentação do poder (Dt 8, 3; 6, 16; Dt 6, 13). Tentação é tudo o que nos assalta no caminho para Deus. Deixando-se orientar pela Palavra de Deus, Jesus enfrenta as tentações e não se deixa desviar (Mt 4, 4.7.10). É em tudo igual a nós, até nas tentações, menos no pecado (Heb 4, 15). Misturado no meio dos pobres e unido ao Pai pela oração, fiel ao Pai e à oração, resiste e segue o seu caminho de Messias- Servo, o caminho do serviço a Deus e ao povo (Mt 20, 28).

Começo da Boa Nova de Jesus, hoje. A semente da Boa Nova entre nós

Marcos começa o seu evangelho descrevendo como foi o princípio do anúncio da Boa Nova de Deus. Talvez nós desejaríamos uma data precisa. Mas o que temos é uma resposta aparentemente confusa; depois Marcos cita Isaías e Malaquias (Mc 1, 2-3), fala de João Baptista (Mc 1, 4-5), alude ao profeta Elias (Mc 1, 4), evoca a profecia de Servo de Yahvé (Mc 1, 11) e faz-nos pensar nas tentações do povo no deserto, depois da saída do Egipto (Mc 1, 13). Agora perguntemos: “Marcos, quando foi o começo: na saída do Egipto, no deserto, com Moisés, Isaías, Malaquias ou com João Baptista? Quando foi?”. O começo, a semente, pode ter sido tudo isso ao mesmo tempo. O que Marcos quer sugerir é que deveríamos aprender a ler a nossa história com outro olhar. O começo, a semente da Boa Nova de Deus, está escondida na nossa vida, no nosso passado, na história em que vivemos. O povo da Bíblia tinha esta convicção: Deus está presente na nossa vida e na nossa história. Por isso ele preocupava-se em recordar os factos e as personagens do passado. A pessoa que perde a memória da própria identidade não sabe de onde vem nem para onde vai. Ele lia a história do passado para aprender a ler a história do presente e descobrir nela os sinais da presença de Deus. É o que Marcos faz no começo do seu evangelho. Trata de descobrir os factos, e aponta o fio da esperança que vinha do Êxodo, de Moisés, passando pelo profeta Elias, Isaías e Malaquias, até chegar a João Baptista que vê em Jesus aquele que realiza a esperança do povo.

Quais são os sinais de esperança, por pequenos que sejam, que existem hoje na nossa história e que apontam para um futuro mais justo e melhor? Eis algumas possíveis sugestões: 1) a resistência e o despertar por todas as partes do mundo de raças oprimidas que procuram a vida, a dignidade para todos; 2) o despertar da consciência do género em muitas mulheres e homens, que revelam novas dimensões da vida que antes não eram percebidas; 3) a nova sensibilidade ecológica que aumenta por toda a parte, sobretudo entre os jovens e as crianças; 4) o conhecimento crescente da cidadania que procura novas formas de democracia; 5) diálogo e debates sobre problemas sociais que suscitam um desejo de maior participação que até transforma as pessoas que no meio do trabalho, do estudo, encontram tempo para dedicar gratuitamente o seu serviço aos outros; 6) a procura crescente de novas relações de ternura, de respeito mútuo entre as pessoas; 7) cresce a indignação das pessoas pela corrupção e a violência. Algo de novo está a nascer que não permite ficarmos indiferentes diante dos abusos políticos, sociais, culturais de classe e de sexo. Há uma nova esperança, um sonho novo, um desejo de mudança. O anúncio da Boa Nova será na verdade Boa Nova se for portadora desta novidade que assoma no meio do povo. Ajudar a abrir os olhos para ver esta novidade, comprometer as comunidades de fé na busca desta utopia significa reconhecer a presença de Deus que liberta e transforma agindo no quotidiano da nossa vida.