BAPTISMO DO SENHOR (ANO A)
12 de Janeiro de 2014
Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Mateus (Mt 3, 13-17)
13Então, veio Jesus da Galileia ao Jordão ter com João, para ser baptizado por ele.14João opunha-se, dizendo: «Eu é que tenho necessidade de ser baptizado por ti, e Tu vens a mim?» 15Jesus, porém, respondeu-lhe: «Deixa por agora. Convém que cumpramos assim toda a justiça.» João, então, concordou. 16Uma vez baptizado, Jesus saiu da água e eis que se rasgaram os céus, e viu o Espírito de Deus descer como uma pomba e vir sobre Ele. 17E uma voz vinda do Céu dizia: «Este é o meu Filho muito amado, no qual pus todo o meu agrado.»
Introdução
Este fragmento evangélico (Mt 3, 13-17) faz parte da secção narrativa do evangelista Mateus e introduz a vida pública de Jesus. Depois da fuga para o Egipto, Jesus vive em Nazaré. Já adulto, encontramo-lo aqui, junto às margens do rio Jordão. Trata-se da parte conclusiva da passagem dedicada a João Baptista, do encontro entre os dois. Quem quiser aprofundar ainda mais a personalidade de João e a sua mensagem (Mt 3, 1-12) deve ter em conta todo o capítulo 3º de Mateus. A passagem deste Domingo centra-se no reconhecimento da divindade de Cristo no momento do baptismo. Deus Pai revela quem é Jesus.
Comentário do texto
Mateus 3, 13: Jesus adulto. Depois do “desaparecimento” de João de cena (Mt 13, 1), Jesus, desde Nazaré, onde passara a sua infância e a primeira juventude (Mt 12, 23), dirige-se para o rio Jordão. Como bom israelita está atento aos movimentos religiosos autênticos que surgem no meio do povo. Aprova a obra de João e decide receber o baptismo de água, não certamente para ser perdoado dos pecados, mas para se unir e compartilhar plenamente as esperanças e expectativas de todos os homens e mulheres. Não é a humanidade que vai até Ele mas é Ele que vai até à humanidade, segundo a lógica da Encarnação.
Mateus 3, 14-15: Diálogo de João com Jesus. A intenção de João de impedir o baptismo de Jesus é o reconhecimento da diversidade entre os dois e o conhecimento do novo (a Nova Aliança) que entra em cena. “Aquele que vem depois de mim... baptizar-vos-á no Espírito Santo e no fogo... tem na mão o balde... limpará... recolherá... queimará...” (vv. 11-12). Jesus submete-se ao plano de salvação de Deus (Convém que cumpramos assim toda a justiça), respeitando o modo (na humildade – kenosis) e os tempos (a hora – kairos). A diferença entre os dois vê-se também pela origem familiar (sacerdotal, a de João), de lugar (Jerusalém, a de João e Nazaré da Galileia a de Jesus), no modo de serem concebidos (anúncio ao pai, Zacarias, segundo o modelo antigo; anúncio à mãe, Maria) a idade dos pais (de idade avançada os de João). Tudo manifesta a passagem do antigo para o novo Testamento. Mateus prepara os seus leitores para a novidade de Cristo: “ouvistes o que vos foi dito, eu porém digo-vos” (Mt 5).
Mateus 3, 16-17: A apresentação de Deus Pai e o Espírito Santo. No evangelho de Mateus temos a solene “adoração dos Magos” como reconhecimento da realeza-divindade de Jesus. Lucas acrescenta também o reconhecimento de Isabel (Lc 1, 42-43), dos anjos (Lc 2, 13-14), dos pastores (Lc 2, 20), dos velhos Simeão e Ana (Lc 2, 30; 28). Em todos os evangelistas, pois, evoca-se a proclamação da identidade de Jesus por parte de Deus Pai e do Espírito Santo presente sob a forma de pomba. Mateus diz precisamente: “Este é”e não “tu és” o meu Filho amado. Jesus é de natureza divina e ao mesmo tempo é o novo Adão, princípio de uma humanidade nova reconciliada com Deus juntamente com a natureza também ela reconciliada com Deus, através da imersão de Cristo nas águas. Os céus são reabertos depois de terem estado fechados durante tanto tempo por causa do pecado e a terra é abençoada.
A entrada de Jesus nas águas prefigura a sua descida aos infernos e realiza-se a palavra do salmista (Sal 74, 13-14), ele esmaga a cabeça do inimigo. O Baptismo não só prefigura mas também inaugura e antecipa a derrota de Satanás e a libertação de Adão.
Não é fácil reconhecer o Messias na sua dimensão de debilidade. João Baptista, ele próprio, também teve dúvidas quando estava no cárcere e manda perguntar pelos seus discípulos: “És tu aquele que deve vir ou devemos esperar outro?” (Mt 11, 3).
Para quem quem queira aprofundar a perspectiva litúrgica e ecuménica
Na tradição da Igreja grega, o Baptismo de Jesus é a festa mais importante das celebrações natalícias. No dia 6 de Janeiro celebra-se em conjunto o Baptismo, o nascimento, a visita dos Magos, as bodas de Caná como uma única realidade. Mais do que o desenvolvimento histórico da vida de Jesus tem-se presente a sua relevância teológica-salvífica. O interesse não se centra no aspecto sentimental mas na manifestação histórica de Deus e no ser reconhecido como Senhor. São Cirilo de Jerusalém afirma que Jesus confere às águas do Baptismo “a cor da sua divindade”. São Gregório de Nissa diz que a criação deste mundo e a criação espiritual, em tempo inimigas, são reunidas na amizade, e nós seres humanos, somos um só coro com os anjos, participamos dos seus louvores.
A descida às águas corresponde a descida às entranhas da terra simbolizada no nascimento na gruta. As águas destrutivas convertem-se em águas de salvação para os justos. As leituras do Antigo Testamento lidas na liturgia das Vésperas lembram as águas que salvam: o Espírito paira sobre as águas na criação (Gen 1), as águas do Nilo salvam Moisés (Ex 2), as águas abrem-se à passagem do povo de Israel (Ex 14), as águas de Mara tornam-se doces (Ex 15), as águas do Jordão abrem-se diante da Arca (Jos 3), as água do Jordão curam o sírio leproso Naaman (2Re 5), etc. Jesus transforma a água em vinho nas bodas de Caná (Jo 2) como sinal de que a salvação chegou.
Nesta festa, na liturgia oriental, existe a tradição de benzer a água submergindo três vezes a cruz (a tríplice imersão baptismal) num poço ou num rio. Evoca-se o profeta Isaías: alegre-se o deserto e a terra árida (Is 35, 1-10), todos vós que tendes sede vinde à nascente das águas (Is 55, 1-13), tirai água com alegria (Is 12, 3-6).