Honra os teus velhos

Um facto ao qual não nos deveríamos habituar é este: que na informação sobre as vítimas da pandemia venha associada a sua idade e a indicação de que eram afetados por outras patologias. Não nos damos conta, mas com isso descemos, de forma irreversível, alguns degraus daquele precioso património comum a que chamamos civilização. Não discuto que a intenção possa ser virtuosa, pois supostamente visa serenar os outros segmentos da população. Mas certas serenidades induzidas têm de ser questionadas, sobretudo se reforçam a vulnerabilidade de quem já tem de suportar tanto. É fundamental que para as nossas sociedades seja claro que há coisas piores do que a infeção com o vírus da covid-19. Se os velhos são reduzidos a números, e a números com escassa relevância humana e social, podemos até superar airosamente a crise sanitária, mas sairemos diminuídos como comunidade. Rodarão as estações. A esta primavera suceder-se-á outra, porventura, mais risonha, distendida e ampla. Mas nunca mais respiraremos da mesma maneira.

É que não se envelhece para morrer. Penso no modo extraordinário e preciso como o livro do Génesis descreve a caminhada do patriarca Abraão. “Abraão expirou... velho e saciado de dias” (Gen 25:8). Sim, não se envelhece para morrer. ???????????? ???? ??? ????????? ?? ???? ? ????? ???? ?????? ???, ????? ??????? ?? ?????????, ? ???? é ? ??????? ???? ?????????, ???? ?????????í??? ? ??ó???? ??? ??? ????? ?? ?????.Com razão, James Hilmann escreveu: “Envelhecendo eu revelo o meu carácter, não a minha morte.” A velhice é um laboratório de vida presente e não só passada, uma escola onde se aprofunda o significado da esperança e do amor. Quando estes sentimentos, despidos já das contaminações do cálculo, distantes do enganador afã dos objetivos que lhe colocámos, revelam finalmente a sua natureza. O que é o amor em si, o que é a esperança sem mais — os velhos sabem-no melhor. E, contudo, resistimos tanto a perguntar-lhes, como se essa transmissão de sabedoria não nos fosse indispensável. Que os velhos se tenham tornado uma abandonada periferia — e os condicionamentos da pandemia podem ainda dramaticamente acentuá-lo — diz muito da crise interior que mina o nosso tempo.

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Precisamos de nos reconciliar com a velhice. É um erro grosseiro representar os velhos como um peso: experimentam-no quotidianamente as famílias que sem a colaboração dos avós não saberiam como conjugar as vidas profissionais com a vida familiar; sabem-no as crianças e os jovens que nos mais velhos encontram disponível um bem que mais ninguém lhes oferece com aquela gratuidade: tempo; constatam-no todos os espaços de convivência humana que dos velhos recebem testemunhos de sabedoria, afeto e resiliência, pois eles felizmente têm olhos para aquilo que mais ninguém vê. O antiquíssimo Livro do Levítico recorda-nos este imperativo de futuro: “Ficarás de pé diante do que tem cabelos brancos; honrarás o rosto de quem é ancião” (Lev 19:32).

José Tolentino Mendonça, Expresso, 25.04.2020

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