MEU PAI E VOSSO PAI
A experiência de liberdade e fraternidade que Jesus propõe a todos aqueles que o seguem, pressupõe uma normal atitude filial para com Deus. Jesus dirige-se a Deus chamado-lhe habitualmente “Abba” (Mc 14, 36), que significa “Papá”. “Abba” é uma palavra infantil, uma das primeiríssimas palavras que a criança aprende a pronunciar. Chamar familiarmente “Papá” a Deus, como o faz Jesus, parece algo insólito e audacioso. Jesus, porém tem uma experiência única de Deus. Conhece-o e é por ele conhecido numa intimidade recíproca absoluta. Dirije-se-lhe com comovida gratidão e total submissão, como o primeiro dos humildes e dos pobres, que sabem que tudo recebem por doação. Mas, precisamente porque recebe a plenitude da vida de Deus, pode falar-lhe com tom familiar e pode falar dele com autoridade: “Bendigo-te, ó Pai, Senhor dos céus e da terra, porque escondestes estas coisas aos sábios e entendidos e as revelastes aos pequeninos. Sim, ó Pai, porque isso foi do teu agrado. Tudo me foi entregue por meu Pai, e ninguém conhece o Filho senão o Pai, como ninguém conhece o Pai senão o Filho e aquele a quem o Filho o quiser revelar” (Mt 11, 25-27).
Deus quer ser “Abba” para todos nós, quer que nos aproximemos dele com a mesma atitude filial, a mesma liberdade audaciosa e firme confiança de Jesus. O apóstolo Paulo compreendeu-o muito bem: “Vós não recebestes um Espírito de escravidão, para cair de novo no temor; recebestes, pelo contrário, um Espírito de adopção, pelo qual chamamos 'Abba, Pai'” (Rom 8, 15).
Jesus, procura por todos os meios despertar o sentimento vivo da paternidade e ternura de Deus. Os homens têm de se convencer de que são amados desde toda a eternidade e chamados pelo seu nome, que não nasceram por acaso e nunca se encontram sós nem na vida, nem na morte. Podem não amar a Deus, mas não o podem impedir de amar primeiro.
Não é fácil para o homem sentir-se intimamente amado por Deus. A superficialidade, a desordem moral, os preconceitos do ambiente que o rodeia, a experiência do mal endurecem-lhe o coração e cegam-lhe o olhar. Mas se na fé se abrir à proximidade do Pai, o homem transforma-se noutro, dotado de uma diferente capacidade de valorizar, de agir, de sofrer e de amar.