A AGONIA E CONDENAÇÃO DE JESUS À MORTE
Depois da última ceia Jesus entra em agonia, isto é, numa luta interior entre o desejo de não ser entregue ao “domínio das trevas” (Lc 22, 53), de escapar à morte sangrenta que se anuncia, e o de realizar até ao fim a vontade do Pai e a missão recebida. Jesus confessa que “está triste com uma tristeza de morte” (Mt 26, 38). Nesta cena dolorosa de combate e de tentação, nesta hora de angústia, Jesus partilha a aflição que qualquer homem sente diante da morte.
Ao contrário dos discípulos que não conseguem contrariar o sono, Jesus dá exemplo de uma oração incessante, dizendo: “Pai, se este cálice não pode passar sem que eu o beba, faça-se a tua vontade” (Mt 26, 42).
Depois da agonia Jesus foi preso, conforme as indicações de Judas, o traidor. Jesus vai sujeitar-se a um duplo processo: primeiro, o judaico, no decurso do qual o Sinédrio, presidido por Caifás, o acusa formalmente de blasfémia, por ter respondido “Dizeis bem, Eu o sou” à pergunta “Tu és, então, o Filho de Deus?”; depois, o romano, ao comparecer diante de Pilatos, o governador da província; só ele tem direito de condenar à morte e de fazer executar a sentença. Por este duplo processo os evangelistas mostram que a morte de Jesus é da responsabilidade dos homens, de todos os homens, que se uniram na mesma cumplicidade pecadora para levar Jesus à morte. Jesus é o Justo, cuja vida e testemunho se tinham tornado insuportáveis aos olhos deles. Ele é o Inocente condenado. Na condenação de Jesus entram em acção simultâneamente, por um lado, a liberdade dos homens e, por outro, a liberdade soberana de Jesus, que se insere nos frutos amargos do pecado para aí fazer triunfar o amor.
Jesus não somente é julgado e condenado pelas autoridades religiosas e políticas, depois de ter sido traído por Judas, mas é escarnecido e torturado pelos soldados, apupado pela multidão que a ele prefere Barrabás, desamparado dos seus e renegado por Pedro. Abandonado à sua solidão, ele faz a experiência do fracasso e da contradição total. A acção que leva à morte é obra dos homens e a acção que leva à vida é obra de Deus. Só o desígnio de amor de Deus (cf. 1Jo 4, 10) podia fazer servir esta morte à reconciliação e à salvação daqueles que a infligiram.
Só quem seriamente ponderou quão pesada é a cruz pode conceber quão pesado é o pecado.
(Santo Anselmo de Cantuária)