Restituir a esperança aos cidadãos
- Depois da queda do Governo no final do ano passado, e passados apenas dois anos desde que o país viveu um quadro de eleições legislativas antecipadas devido à dissolução do Parlamento, os cidadãos portugueses são de novo chamados às urnas antes de tempo para, no próximo dia 10 de março, escolher aqueles e aquelas que os vão representar na Assembleia da República.
- Os últimos meses foram abundantes em crises que adensaram a desconfiança dos portugueses em relação às instituições, em particular na esfera política e judicial. Às difíceis condições de vida de tantos portugueses, em especial dos jovens, esta crise de confiança rouba a esperança a tantos que não conseguem encontrar trabalho e, quando o encontram, o seu rendimento é insuficiente para terem uma vida digna: ter habitação, acesso à educação ou dinheiro para pagar as despesas. Vivemos um momento difícil, mas desafiador. Diante das dificuldades, somos convocados pelo momento que o país vive a refletir sobre o que queremos e podemos fazer pelo nosso futuro.
- No tempo de debate e reflexão pré-eleitoral em que nos encontramos, exige-se um diálogo honesto e esclarecedor entre os partidos políticos, com a apresentação de programas exequíveis e conteúdos programáticos que não se escondam por detrás de manobras mediáticas e defraudem a esperança dos cidadãos. Como diz o Papa Francisco na Encíclica Fratelli Tutti, “a política é mais nobre do que a aparência, o marketing, as diferentes formas de maquilhagem mediática”. Só assim os cidadãos podem optar pela adesão a projetos concretos e não a votar pela raiva ou desilusão ou, pior ainda, a não votar.
- Quando o Papa Francisco esteve em Portugal, por ocasião da Jornada Mundial da Juventude Lisboa 2023, deixou indicações aos dirigentes políticos portugueses para que sejam agentes da “boa política”, geradora de esperança e construtora do bem comum: a política que “não é chamada a conservar o poder, mas a dar às pessoas a possibilidade de esperar”; a política que “é chamada, hoje mais do que nunca, a corrigir os desequilíbrios económicos dum mercado que produz riquezas mas não as distribui, empobrecendo de recursos e de certezas os ânimos”; a política que “é chamada a voltar a descobrir-se como geradora de vida e de cuidado da criação, a investir com clarividência no futuro, nas famílias e nos filhos, a promover alianças intergeracionais, onde não se apague o passado mas se favoreçam os laços entre jovens e idosos”; a política que é chamada a “retomar o diálogo entre jovens e idosos”.
- A responsabilidade é de todos, dos políticos e de quem os elege, dos que definem projetos e de quem faz escolhas, daqueles que apresentam propostas e de quem se preocupa em delas ter conhecimento para votar conscientemente. Escolher quem nos representa no Parlamento é um dever de todos e ninguém deve excluir-se deste momento privilegiado para colaborar na construção do bem comum. A abstenção não pode ter a palavra maioritária nas eleições do próximo dia 10 de março.
- Continua a ser inspirador para o eleitor católico o documento de 2 de maio de 2019 da Conferência Episcopal Portuguesa, “Um olhar sobre Portugal e a Europa à luz da doutrina social da Igreja”, publicado nas vésperas de anteriores atos eleitorais e que aponta quatro princípios a presidir à decisão do voto: toda a vida humana tem igual valor; o bem tem de ser de todos e de cada um sem ser ditadura da maioria; a casa comum é para cuidar; nem Estado centralizador, nem Estado mínimo.
- Enquanto cristãos, à luz do Evangelho e da Doutrina Social da Igreja, temos a responsabilidade acrescida de participar na vida política e na edificação da comunidade. Somos chamados também a trazer à nossa oração todos os homens e mulheres que servem a política. Votar, de forma esclarecida e em consciência, é uma responsabilidade que decorre da vivência concreta da nossa fé no meio do mundo.
Fátima, 19 de fevereiro de 2024