8º Dia: Jesus Cristo, a fonte da misericórdia (14 de Julho)
Depois de ter mostrado que a misericórdia do Pai, por Ele manifestada, só é revelada aos pequenos, Jesus chama-nos hoje a vir ter com Ele. “Vinde a Mim”, é o convite que Jesus dirige a todos os que andam cansados, em busca de apreço, afeto e reconhecimento; agitados, por causa do seu apego às coisas terrenas; oprimidos pelo medo e a falta de esperança; vazios pelo pecado e afastamento de Deus; sofridos por causa da doença, do abandono ou da solidão. É a eles e a cada um de nós que Jesus dirige o seu convite.
É a si que Ele nos incita a vir com toda a confiança, prometendo: “E eu vos aliviarei”. Convida-nos a entrar em nós e a aí nos encontrarmos com Ele, entregando-lhe toda a nossa vida e preocupações, aceitando-o como único Senhor e Pastor da nossa vida. Não foi este mesmo apelo que os primeiros carmelitas, desejosos de viver em obséquio de Jesus Cristo, escutaram? De facto, é só n’Ele que se encontra a vida e a paz: “Vós nos dareis a paz, Senhor, porque sois Vós que realizais tudo o que fazemos” (Is 26,12).
Esta paz, porém, só a experimenta quem, escutando a sua voz, vem a Jesus e toma sobre si o seu jugo, obedecendo-lhe e seguindo com Ele o seu caminho, deixando-se guiar por Ele e imitando-o, imbuído do seu Espírito.
Por isso Jesus dirige um segundo convite: “aprendei de Mim, que sou manso e humilde de coração”. É o convite a entrar na escola e moradia do Seu Coração, como diz Maria Madalena de Pazzi (III,149s; VI,210), para nele, saboreando e vendo como o Senhor é bom, beber, como crianças recém-nascidas (v. 25), o leite não adulterado da sua Palavra (1 Pd 2,3), de modo a aprender as coisas do Reino, conhecendo o verdadeiro rosto de Deus, Pai de misericórdia, para ser renovados pelos tesouros inesgotáveis da Sua graça, que Ele nos concedeu em seu Filho, Jesus Cristo.
É aí que, como numa escola, 1) aprendemos a ler os desígnios do Seu Coração nos caminhos da nossa vida; 2) procurando encarná-los na própria existência, repetindo os seus mesmos gestos e palavras, iniciativas e atitudes, com a sua mesma disposição e sentimentos: a mansidão e a humildade, próprias dos pobres em espírito, de quem é o Reino de Deus. De facto, como nota Madalena de Pazzi, é só avançando pelo vale da humildade e perdendo-nos no oceano da mansidão que podemos encontrar este repouso que Jesus nos promete, porque é só então que Jesus repousa em nós (IV,112). Mansidão, nas relações com o próximo, pela qual, rejeitando toda a soberba e altivez, acolhemos os outros, os escutamos e aceitamos, com compreensão e apreço, doçura e serenidade, pondo de lado toda a guerras e conflito, inveja e ódio, ressentimento e falta de perdão. Humildade, nas relações com Deus, não aspirando a coisas altas, mas esforçando-se por traduzir a Sua vontade na terra da própria vida, com a ajuda da Sua graça. Quem o faz, encontrará descanso, como promete Jesus.
“Porque o meu jugo é suave e a minha carga é leve”. É suave, porque quem o aceita, libertado da morte do pecado, reconcilia-se com Deus, consigo mesmo e com os outros, passando a viver repleto de alegria e esperança, de amor e confiança (cf. Is 9,5). É leve, porque, como Santa Teresinha diz, avança pelas vias da confiança e do amor, sabendo que “o que mais ofende a Jesus e O fere no coração, é a falta de confiança” (Ct 92,2r; cf. MA 80v).
Iluminada e transformada por Deus, essa pessoa torna-se um sábado, dia de repouso e de santidade para Deus, sendo chamada, com razão, Jerusalém, quer dizer visão de paz (II,71), pois Jesus e o Pai a ela vêm, nela estabelecem a sua morada e encontram o seu repouso, manifestando-lhe o seu amor e difundido a sua paz, fruto da Sua inabitação nela (I,105; Jo 14,23).
Longe, porém, de ser uma paz morta, este repouso, que brota do Coração de Jesus, só é saboreado por aqueles que não descansam (V,106): é descanso obtido com tanta fadiga; paz alcançada com uma contínua guerra contra o próprio eu; contentamento, gozo e alegria, fruto de tanto esforço, dor e aflições; luz, a que chegamos depois de passarmos por tantas trevas e tentações, confusão e aflições, interiores e exteriores” (III,67). Não é, também, um descanso individualista. O mesmo Jesus que diz: “Vinde a Mim”, é o que exclama na cruz “Tenho sede” (Jo 19,28) e por duas vezes pede à samaritana: “Dá-me de beber” (Jo 4,7.10). Se o repouso que jorra do Coração de Jesus, vem do Sua presença em nós, é porque o lugar do repouso de Jesus é o nosso coração. Por isso, quem achou Jesus, não descansa, procurando, pela palavra, o exemplo e a oração, atrair muitos corações a Ele, para que O encontrem e nEle repousem, deixando-O repousar no seu. Isto estende-se também à prática das obras de misericórdia, pois, ao ver os outros a sofrer, perturbados, inquietos ou aflitos, vai ao seu encontro, tudo fazendo e estando disposto a tudo suportar para os aliviar, consolar e restabelecer, “porque este coração assim inquieto sabe que não dá repouso a Deus, enquanto não lhe der as suas criaturas” (VII,249s), redimidas com tanto amor e misericórdia por Cristo na cruz. Que Maria, doce Mãe, mansa (Mater mitis) e repleta de misericórdia, pela qual nos veio a salvação e a paz, faça de nós obreiros desta paz no mundo. Ámen.